Quando abordamos o campo de estudo de comunidades online nas mídias sociais, uma dúvida que sempre surge é: é possível coletar os dados destas comunidades online de forma automatizada ou é necessário sempre fazer a coleta manual? E esta é, de fato, uma dúvida muito pertinente – principalmente nos dias atuais, em que há uma ‘demonização’ de tudo aquilo que não é automatizado, devido a uma misticidade criada em torno de termos como Big Data.
Antes de prosseguirmos neste tema, porém, faz-se necessário definirmos o conceito de comunidade online a fim de que todas as leitoras e leitores deste texto estejam no mesmo degrau de definição de conceitos.

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Imagem: wocintechchat.com

O que é uma comunidade online?
Um dos primeiros pesquisadores a utilizar e definir as comunidades que ocorriam em ambiências online foi o pesquisador Howard Rheingold que, em 1993, criou o termo ‘comunidade virtual’.
Estas comunidades online são muito mais que agrupamentos forjados nas ambiências online em que ocorre uma simples transmissão de informação. Os grupos articulados em comunidades online compartilham interações pessoais, laços sociais, espaços e/ou localização, e formatos. Comunidades online são, portanto, como o próprio autor definiu,

“Agregações sociais que emergem da rede quando um número suficiente de pessoas empreende (…) discussões públicas por tempo suficiente, com suficiente sentimento humano, para formar redes de relacionamentos pessoais no ciberespaço.” (RHEINGOLD, 1993, p. 3)

Nestas comunidades online, as pessoas

“(…) trocam gracejos e discutem, envolvem-se em discursos intelectuais, fazem comércio, trocam conhecimentos, compartilham apoio emocional, fazem planos, brainstorm, fofocam, brigam, apaixonam-se, encontram e perdem amigos, disputam jogos, flertam, criam um pouco de grande arte e um monte de conversa à toa.” (Idem, 1993, p. 3)

Não é a toa, portanto, que, logo que surgiram, estas comunidades online começaram a chamar a atenção de diversas pesquisadoras e pesquisadores interessados em estudar estes espaços e as trocas humanas que aconteciam lá dentro. E até hoje é assim: as comunidades online são um riquíssimo material para quem quer estudar tendências, comportamentos humano, organização e articulação de movimentos, entre outros.
Um dos espaços mais comuns, nos dia de hoje, de encontrarmos agrupamentos com características de comunidades online são os grupos do Facebook – ambientes em que há o agrupamento privado ou público de perfis com interesses de filiação a um tema específico ou apenas para aproximação de relação pessoal.
Coleta de dados destas comunidades
Voltando ao tema inicial de nosso texto, já que estes espaços são tão importantes para se realizarem pesquisas, uma das principais preocupações é a coleta de dados. Existem comunidades online que se forjam no Facebook, por exemplo, em que há a participação ativa de muita gente.
Assim, uma coleta inicial automatizada de dados pode ajudar – e muito! – a pesquisadora ou o pesquisador a formular as primeiras hipóteses, entender as métricas mais básicas e ser um primeiro ponto de contato com o que está acontecendo lá dentro. Dependendo do nível de profundidade de dados que a pesquisadora ou pesquisador precise, é possível que a coleta automatizada já resolva. Porém, conforme o nível de profundidade dos questionamentos for aumentando, dificilmente a coleta poderá parar aí.
Sociograph: ferramenta que pode ser utilizada para coletar dados de comunidades online no Facebook
sociograph inicio
Sociograph é uma ferramenta gratuita em que é possível se coletar alguns dados de grupos e fanpages através do login por Facebook Connect (quando você acessa a ferramenta fazendo o login pelo seu perfil do Facebook).
O único porém desta ferramenta é que se é necessário ser administrador da Fanpage e/ou do Grupo em que se quer coletar os dados – obviamente por questões de segurança e de direito à privacidade das pessoas presentes naquele ambiente. Assim, se você não é administradora (o) do ambiente em que se quer estudar, vale a pena o mapeamento e a conversa com os administradores para te darem o acesso prévio de administração, através do consentimento em participação na pesquisa.
Além da etnografia, há pesquisadoras e pesquisadores que criam grupos e fanpages com temáticas específicas e convidam pessoas a participar, monitorando e acompanhando as pessoas em um espaço controlado por ela ou por ele. Esta técnica tem similaridades com os grupos focais – uma das principais técnicas da pesquisa qualitativa.
Com o Sociograph é possível ver de forma ordenada as postagens feitas cronologicamente e obter informações relacionadas a datas, tipos de postagens, autores, estatísticas de compartilhamentos, comentários e curtidas e o próprio conteúdo da postagem.
Além disso, é possível também ver algumas métricas relacionadas aos participantes da comunidade, que nos mostra a participação de cada um dentro da comunidade.
sociograph visitors final
Uma métrica interessante é a relação do quanto esta pessoa interage com as postagens feitas pelos outros integrantes da comunidade e o quanto as suas postagens recebe de interação dos outros participantes – métrica denominada Karma pela ferramenta.
sociograph karma
Uma funcionalidade bem interessante também é que é possível exportar as informações para uma base de Excel, já deixando os dados estruturados para serem analisados e trabalhados.
Como falamos, para um raio-x inicial de uma comunidade online, esta ferramenta pode ser muito útil. Se a pesquisadora ou pesquisador precisar de informações mais profundas, outras técnicas de coleta de dados – e manuais – precisam ser aplicadas.
O que temos percebido cada vez mais é a importância de se casar cada vez mais o quanti com o quali. Como Tarcizio Silva (2017) aponta, há uma infrutífera cisão entre quanti-quali que precisa ser superada, buscando reduzir o “fôlego” dos dados (breadth) em prol de sua profundidade – ou thickening – engrossamento.
Bibliografia
SILVA, Tarcizio. Thickening no monitoramento e etnografia em mídias sociais. IBPAD, 2017. Em: http://www.ibpad.com.br/blog/thickening-como-conceito-no-monitoramento-e-etnografia-em-midias-sociais/
RHEINGLOD, Howard. The virtual community: Homesteading on the electronic frontier. MIT press, 2000.